sábado, 1 de agosto de 2009

SERÁ QUE VOCÊ ME ENTENDE?

A difícil e excitante tarefa de entender o que se passa na cabeça alheia não é privilégio de planejador. Traduzir pensamentos em linguagem é naturalmente um desafio que desde sempre estimulou o ser humano a se virar com inúmeras técnicas, da mímica à agência de propaganda. Tente, por exemplo, imaginar como seria ter que traduzir pensamentos através de arte. É o que se pode conferir na exposição “Walking in my mind”, que está rolando na Hayward Gallery em Londres. Trata-se de “uma expedição ao misterioso processo criativo mental” de artistas plásticos. Dez artistas usaram de pintura a sinal de fumaça pra traduzir como é sua mente durante a criação (ou como eles gostariam que a gente acreditasse que ela é). E a gente anda lá no meio das instalações, como se estivesse naqueles brinquedos de parque de diversões, topando tanto com lata de refrigerante quanto com pornografia. O grande barato de viver a experiência de estar dentro da mente deles é reconhecer coisas que provavelmente também estariam na sua e tentar imaginar como você faria essa tradução. Um dos artistas, o Thomas Hirschhorn, declarou que a obra dele foi concebida com a intenção de criar condições para que aconteça ‘a atividade do pensamento’ por parte do espectador: ”quero provocar um diálogo ou um confronto na cabeça da outra pessoa”. Não tenham dúvida de que ele conseguiu.

Motivadas pela mesma pergunta, antropologia e psicologia já foram bem longe na tentativa de entender o pensamento humano, embora elas ostentem diferenças fundamentais. Enquanto a primeira tem uma preocupação mais coletiva e olha para o ‘ser social’, a segunda se volta para o ‘indivíduo’, procurando compreender seus processos mentais isoladamente. Não à toa, antropólogos e psicólogos costumam discordar bastante sobre particularizar demais (antropologia) ou generalizar demais (psicologia) uma verdade sobre o ser humano. Mas quando eles se entendem o resultado é muito interessante. Maurice Bloch, antropólogo professor na LSE (Londres), é exemplo vivo disso. Ele não teve a chance de passear dentro da cabeça de ninguém, como a exposição sugere que é possível, mas a sua produção acadêmica pode ser considerada fruto dessa tentativa, que é antropológica mas está cheia de insights da psicologia. Abordando a relação entre eventos, memória e narrativa, ele tenta provar que a transmissão do conhecimento, de geração para geração, não é só produto do pensamento mas também é causa. Afinal, nem tudo o que fica guardado aí na sua memória é 100% fiel aos acontecimentos, tem muita coisa que você confunde, muda, cria e passa adiante com outra formatação. Isso é criar história através de narrativa.

Depois da exposição e da universidade, te convido para um café e te faço uma pergunta: como você traduziria o que se passa na mente do seu consumidor? Se você está atento ao discurso das marcas e ao que declaram as pessoas que as consomem, em infindáveis grupos de pesquisa, você deve ser capaz de imaginar um ambiente “Walking in my mind” só com base nessa narrativas. Muito mais enriquecedor do que levar ao pé da letra o que o consumidor fala em sala de espelho. Penso no quanto ainda estamos presos a antigos padrões de pesquisa e de apresentação e às vezes tenho vontade de migrar para o mundo da arte pura, só pela certeza de que poderei traduzir melhor os pensamentos sem amarras de verba, prazos malucos, cliente muito conservador ou velhos hábitos. Será que você me entende?

2 comentários:

  1. entendo muito!! rs...
    querida, vc ta escrevendo cada vez melhor (e com menos palavras, hehehe).
    acho que tenho uma pessoa para te apresentar. não sei se é bem o que vc procura, mas tem uma visao diferente e interessante de negócio... vamos falar mais sobre isso!
    bjo!

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  2. Paulinha... Que maximo, eu ouvi falar dessa exposicao e estava louca para ir..
    Eu te entendo bem olhando na perspectivas de hospedes em vez de consumidor... Boa sorte com a dissertacao.. e nao vejo a hora de ter altos papos com voce enquanto estiver morando em casa! Beijos Mi

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